A tragédia de nós mesmos

inferno27Hoje cheguei a uma conclusão da qual meus colegas jornalistas vão discordar: ser pai e cobrir tragédias humanas são tarefas impossíveis. Desde muito nos perguntamos, a que viemos… a que viemos? Para que viemos? A história do pai que fugiu da Siria,da imbecilidade da guerra da Síria, com sua mulher e seus dois filhos pequenos,confesso, me levou às lágrimas, assim como deve ter feito com milhares e milhares de pessoas. Um pai que tentando fugir da guerra, tentando fugir de um bando criminoso declarado Estado islâmico pede asilo dos Estados Unidos e no Canadá e é reprovado, e assim, tentando chegar a Europa em um barco super lotado que naufraga, fazendo com que ele perca suas únicas riquezas, sua família.

Não posso imaginar o sofrimento deste pai ao ver seus dois filhos pequenos de afogando, não consigo sequer tocar um pouco de sua alma, a minha, apenas vendo aquela maldita foto já está dilacerada, e eu.. tenho como maior preocupação no momento o pagamento de algumas contas que subiram por conta da crise economica brasileira.

Ninguém nunca te conta, mas ser pai é abrir mão da dureza da alma, é aprender a amar alguém que você jamais conheceu antes, é saber que cada passo que você der irá influenciar diretamente na vida daquela criatura. Ir, ficar, postergar, agir, não há respostas fáceis, tampouco há um manual de instruções, o que existe de fato é a vida e as suas consequências. Agora lhes pergunto: o que esperar deste pai? Um perdão total e incondicional? Esperar que ele acuse as grandes potências que o recusaram como ser humano ou as bestas humanas que fizeram que ele tivesse que fugir?

Sim, este pai é uma vítima e logo deve se tornar dono de um coração tão fechado, tão amargurado que não haverá algo que possamos lhe cobrar. Para este homem, tudo é válido, não há mais caminhos certos, ele já perdeu tudo. Ele está nu. Ele está sozinho, só lhe resta como companhia a triste lágrima da lembrança. E assim é a vida, um amontoado de personagens em que mocinhos e bandidos se confundem.

A tragédia mora em nós mesmos, em nosso desprezo mútuo, na nossa besta vontade de querer sempre o mais, de querer sempre impor nossas crenças aos que ou não se interessam ou simplesmente creem em algo diferente. Somos podres, tristes e medíocres. Matamos pela vingança, buscamos o inalcançável e jamais temos o ponto final.

Não amigos, não é possível ser pai e jornalista. Não é possível ser pai e impassível, assim como ensina a boa regra do jornalismo, frente as mazelas que nós mesmos criamos no mundo. A criança de bruços naquela praia turca é a nossa esperança de um mundo melhor, morta e impassível, alheia a tudo, já não faz mais parte deste mundo.

+ Aylan, Galip Kurdi, minha oração segue com vocês!

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